segunda-feira, 27 de abril de 2015

Falando sobre Cotas

1) Qual a origem das cotas?


2) Por quê é tão forte ainda o discurso de que as cotas "roubam vagas" e a formação dos alunos é prejudicada, quando todos os dados mostram o contrário?

Dojival: Meu caro, a resposta a pergunta não pode ser feita sem que façamos a contextualização a respeito do que é o racismo e porque o racismo no Brasil é desse tipo – camuflado, dissimulado.

Você não encontrará ningém assumidamente racista, como se sabe.

Bom, primeiro é preciso lembrar que o Brasil foi o último país do mundo a abolir a escravidão – há apenas 127 anos. A escravidão negra aqui foi o modelo legal adotado por quase 400 anos. De cada 10 dias da história do Brasil sete foram vividos sob escravidão e isso explica muito do que somos hoje.

Depois, a Abolição aqui foi adotada por pressão externa – a Inglaterra, a pátria da revolução industrial, precisava expandir o mercado de trabalho assalariado, e também pela luta dos negros que, no final do século XIX, ganhou o apoio de importantes setores da classe média liberal.  Ao contrário do que uma certa corrente pretende fazer crer, os negros nunca foram dóceis, passivos à escravidão.  A resistência começou desde a chegada do primeiro negro e ganhou a forma de rebeliões como a Revolta dos Malês, em 1.835, na Bahia, entre outras, além da luta quilombola.

Só para que se tenha uma ideia, há comunidades remanescentes de quilombos às dezenas em todos os Estados do Brasil. Em S. Paulo, por exemplo, são mais de 100 quilombos, 26 dos quais já com títulos de propriedade das suas terras.

Quanto ao discurso de que as cotas “roubam vagas” é o argumento mais tosco, mais sem noção (para usar uma linguagem muito própria dos mais jovens). Roubam vagas, de quem cara pálida? Por um acaso, a Educação, segundo a Constituição brasileira não é um direito de todos os brasileiros.

Por que uma minoria branca, os herdeiros da Casa Grande, se sentem “donos” das vagas nas Universidades públicas que são mantidas com o imposto de todos os cidadãos brasileiros?

Como você vê é um argumento que não se sustenta em pé. A ausência de argumentos dos contrários, por outro lado, expõe a justeza da luta pelas cotas e pelas ações afirmativas, que hoje não são apenas uma reivindicação dos negros e dos setores antirracistas, mas também uma posição endossada pelo Supremo Tribunal Federal que, em sessão histórica no dia 26 de abril de 2012 considerou que as cotas são constitucionais, baseado no fato de que nascer negro no Brasil representa uma desvantagem.

Na verdade, o argumento dos que acham que as cotas “roubam vagas” desmascara os seus defensores, na medida em que expõe o pano de fundo que está por trás de quem o defende: o medo de perder espaço e poder.

Sim, porque o espaço da Universidade que até pouco tempo era monopolizado quase que 100% pelos brancos, herdeiros da Casa Gande, começa aos poucos a ser mais diverso. A presença negra começa a se fazer sentir por conta das políticas de cotas adotadas pelas Universidades.

Como você sabe, saber é poder e, claro, a elite branca que se beneficia da exclusão negra dos espaços de saber – e de poder – claro, não quer perder esses espaços nem o poder que lhes garante o usufruto de privilégios seculares.

Agora, uma coisa importante: cotas são uma espécie do gênero Ação Afirmativa. Toda cota é uma ação afirmativa, mas nem toda ação afirmativa é cota. Ações Afirmativas são políticas públicas e ou privadas adotadas para compensar a desvantagem histórica acumulada por determinados grupos humanos. Quem mais sofreu desvantagem no Brasil que os milhões de negros escravizados durante quase 400 anos?

Sou a favor de cotas, mas sou principalmente a favor de ações afirmativas, porque entendo que a luta contra o racismo – que é um dos elementos estruturantes da desigualdade social brasileira – é inerente a luta mais geral do povo brasileiro por democracia, por um Estado Democrático de Direito e por uma República digna desse nome – res pública (coisa pública).

3) Os detratores da medida alegam que ela fere a isonomia, trata-se de um privilégio. Explique-nos sobre seu amparo legal.

4) Outro argumento usado é que deveríamos investir na educação básica. Há algo pernicioso nessa afirmação?

5) Como era sua rotina na Universidade? Sofreu alguma discriminação por ser aluno cotista?

6) Qual a importância das cotas no serviço público?

7) Por quê o tema é evitado nos meios de comunicação tradicionais ou sempre é tratado de maneira tendenciosa?

8) Quando se fala em cotas por renda ou para pessoas com deficiência,há aparentemente uma grande aceitação. Qual o motivo?

9) As cotas são a única política de ação afirmativa?

10) Quais avanços já são perceptíveis e que resultados elas podem produzir a longo prazo?


Os(as) entrevistados(as)

Dojival Vieira é advogado e jornalista.Atualmente dirige e edita o portal Afropress.

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